Fonte: Blog Quintarola – Postado por Claudia Souza
O que eu tenho visto é um progressivo (re)inventar-se da literatura infantil. Uma vontade de inventar-se como literatura mesmo, já que até bem pouco tempo dominava o caráter educacional (muitas vezes até didático) dos livros pra crianças. Era meio “fácil”, devo dizer, porque bastava transplantar lições para palavras e imagens, sempre com um conceito de Infância grudado na Escola, na aprendizagem.
A tendência atual, me parece, é bem mais ousada. Note-se as Feiras de literatura infantojuvenil, os prêmios, a globalização, os investimentos no setor. Não é coisa pouca.
Mas pra se desenrolar, a literatura infantil precisa resolver algumas questões cruciais em nível político, filosófico e até plástico.
O modo como se concebe o público infantil mudou. Já é possível perceber a criança como cidadã comprometida com seu tempo e não só como “devir” ou “tavola rasa”. Mas tem muita gente que aproveita justamente dessa nova concepção pra vê-la (e querer mantê-la) como consumidora.
Tem muita coisa boa disponível no Mercado, mas tem muita, muita porcaria, daquele tipo feito pra entreter e basta. Ou pior ainda, do tipo que propõe conceitos politicamente desprezíveis.
O que tem de coisa boa leva em conta, mais que a utilidade, a qualidade do texto e das imagens e ainda a relação entre esses dois âmbitos, considerando contextos, estruturas sociais e culturais. Algumas propostas pecam num lado, outras no outro. Não é fácil “falar” pras crianças, muita coisa que poderia ser boa escorrega bem aí, no discurso, e acaba não acessando os pequenos leitores. Seja pela inadequação das palavras ou pela hiper-elaboração das imagens. Acontece.
A literatura infantil atual navega no meio de muitas armadilhas. Preconceitos, visões distorcidas, manutenção do status quo, medo de apostar no que é diferente, “inanição da inovação”. Mas tem feito passos importantes em direção a uma consciência planetária (pra isso os e-books tem contribuído muito).
Os editores têm um papel fundamental nisso tudo. Mais que os escritores ou que os ilustradores. Uma boa editoria é que vai garantir às crianças uma literatura potente, importante e ao mesmo tempo acessível.
Esperemos.
Sobre a autora deste texto:
Claudia Souza é escritora e psicóloga com especialização em psicopedagogia, psicolinguística e educação artística. Mineira, mora em Milão há seis anos. Publica livros infantis em português, italiano e inglês e artigos em jornais e revistas no Brasil e na Itália. Pesquisadora da Infância, trabalha em projetos de intervenção cultural direcionados a crianças, entre eles o grupo ProgettoQualeGioco e o Istituto Callis Italia. Trabalha ainda na International School of Milan. (www.quemconta.wordpress.com)
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