Ele se chamava Joaquim, mas era conhecido pelos alunos como Joca. Apesar do apelido, todos tinham medo dele. Era professor de Português muito exigente. Os pais gostavam dele. Os alunos não.
Joaquim, no entanto, guardava um segredo. Algo que ele não contava nem para os amigos mais íntimos. Ele também era escritor. Participava de concursos literários, ganhava certificados, medalhas, troféus, exemplares e dinheiro.Muito dinheiro. Os textos eram escritos na alta madrugada. No prédio, só se escutava o teclado a bater. E as ideias de Joca eram as melhores. Porque não eram suas. Eram dos seus alunos.
Joca era um ladrão.
As inscrições para um concurso de contos começava. Lá ia ele solicitar que seus alunos escrevessem contos. Uns até gostavam, outros odiavam. Não sou escritor, reclamavam. Mas Joca não ligava, ou melhor, ligava e lançava seu olhar maquiavélico, afinal os fins justificam os meios, e silenciava qualquer tentativa de ousadia contra os seus pedidos de produção textual.
Lá vinha um concurso de crônicas e Joca fazia o mesmo. Poemas então, quando a exigência eram sonetos, quem suava para construir as rimas eram os alunos.
E Joca na madrugada selecionava as melhores ideias, reescrevia, revisava, organizava tudo e enviava para todos os concursos. Não se esquecia ou deixava de participar de nenhum. A princípio, mudava os títulos dos textos, a fim de evitar futuros problemas. Mas com o tempo foi ganhando confiança e chegou a enviar os melhores textos dos seus alunos sem mudar uma vírgula.
Um dia, Carol escreveu um poema sobre liberdade. E Carol que nunca fora de gostar muito dos textos que fazia, ficou entusiasmada com o próprio. Num dia, Carol resolveu digitar o título do próprio poema no Google. Coisa de quem não tem exatamente nada demais ou de melhor para fazer.
E ela viu. E se revoltou contra o professor que tinha ganhado um concurso com um poema de título igual ao dela. Não podia ser apenas coincidência. Fuçando na Estante Virtual, conseguiu comprar um exemplar da antologia. E lá estava o poema tal qual ela escreva. Nem uma palavra o professor Joca mudara.
Carol foi à diretora, mostrou tudo, acusou. Causou. Gerou confusão. O professor Joca foi ouvido, descoberto e demitido.
E preso.
Atualmente, escreve contos, crônicas e poemas a partir dos relatos dos seus companheiros de cela e dos que encontra no pátio. Muda os nomes dos personagens e continua ganhando nos concursos.
Mas eis que hoje na biblioteca da penitenciária chegou uma das antologias em que participou e Caveirão para reduzir um dia da sua pena resolveu ler…
#PalavraJovem é a série de crônicas escrita por Severino Rodrigues e publicada semanalmente, todas as quintas-feiras, no Portal Mundo Leitura. Este pernambucano é autor dos juvenis de suspense: Sequestro em Urbana, 2013, e Mistérios em Verdejantes, 2015, livros publicados pela Cortez Editora.
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