Dá pra viver de ilustração no Brasil?

Por Simone Cavalcante

Paulistano de origem e detentor de um olhar artístico universal, Fábio Sgroi é um dos nomes representativos da ilustração de livros infanto-juvenis no Brasil. Formado e pós-graduado em Design Gráfico e Multimídia e conselheiro da Sociedade dos Ilustradores do Brasil (SIB), ele já ilustrou livros nos segmento didático, paradidático e de literatura para várias editoras atuantes no país, incluindo nessa lista a Editora do Brasil, Salamandra e Panda Books.

 

Mundo Leitura – É possível viver, no Brasil, da profissão de ilustrar livros?

Fábio – Este é o meu caso. É claro que como toda profissão, existem altos e baixos, mas é perfeitamente possível, sim.

 

Mundo Leitura – Quais as maiores conquistas e obstáculos do segmento?

Fábio – A maior conquista enxergo especialmente na valorização que a literatura infantil e, em especial, a ilustração desses livros, tem recebido de uns tempos para cá. Eventos como o que houve no SESC belenzinho em SP no início deste ano e espaços cada vez maiores que revistas e programas de TV têm reservado para este tema só confirmam esse interesse. Minha única ressalva fica por conta de que, vez ou outra, acaba surgindo uma glamourização meio boboca da profissão de ilustrador. Por outro lado, ter livros ilustrados em casa ainda não é hábito na maioria das famílias. Livros não estão entre as opções de consumo para crianças e jovens, que sempre tendem para games, DVDs… Mas o grande obstáculo mesmo está no gargalo de vendas do produto livro ilustrado. Este tipo de indústria sobrevive basicamente de compras governamentais e adoções em escolas, ou seja, o comércio destes produtos ainda não é capaz de sobreviver da simples compra e venda entre a editora e o consumidor final, o leitor. O mercado de quadrinhos que o diga. Só depois que o governo colocou HQs em sua lista de compras é que esse mercado ressurgiu.

Mundo Leitura – Você afirmou na matéria do Le Monde que existe um estilo brasileiro de ilustrar. Mas eu pergunto se esse estilo brasileiro é uniforme ou se abre para a diversidade cultural brasileira?

Fábio – Sem dúvida que se abre para uma diversidade. O problema é garimpar essa diversidade. Vivemos numa sociedade de consumo em que tudo tende a ser uniforme, onde acaba sendo normal (de uma maneira bizarra, claro) os clientes solicitarem que a ilustração emule um estilo A ou B que está na moda. Assim, se olharmos apenas na grande mídia, não encontraremos muita diversidade. Mas se procurarmos em meios alternativos, que não estejam tão comprometidos com números de vendas, com certeza encontraremos trabalhos cujo frescor encherão nossos olhos. Felizmente, essa massificação também parece não ter atingido os livros ilustrados de literatura. É possível encontrar grande variedade de estilos e propostas nesse segmento, coisas que realmente produzem encantamento e proporcionam uma experiência estética.

Mundo Leitura – Se pudéssemos mapear a diversidade de elementos de nossa cultura, reconfigurados na ilustração, que ilustradores você tomaria como exemplo?

Fábio – Mário Bag e Ciça Fitipaldi seria um bom começo. O trabalho do Mário evoca a xilogravura, coisa que nos remete imediatamente ao cordel e ao nordeste, mas possui um colorido e um humor bastante característicos do autor; não se trata apenas de uma mera referência, mas de uma linguagem própria dele construída a partir da xilogravura. Já a Ciça pesquisou a fundo a cultura indígena e seu trabalho reflete em suas cores e formas toda essa vivência.

 

Livro escrito e ilustrado por Fábio Sgroi em 2008

Mundo Leitura – Quais as técnicas mais comuns utlizadas hoje no Brasil?

Fábio – Sinto-me tentado a dizer que a técnica predominante hoje é a do computador, que é capaz de simular um monte de técnicas, de combiná-las, fundi-las, misturá-las… Nada contra. Com prazos cada vez mais apertados, as facilidades que o computador oferece são praticamente indispensáveis. Fora essa questão, não vejo uma predominância de técnica propriamente dita. Faz parte da diversidade a que me referi anteriormente.

 

Mundo Leitura – Como as novas ferramentas digitais contribuem para a elaboração dos desenhos?

Fábio – As teclas “Control” “Z” que o digam :). Mudar um rabisco que não saiu do jeito que se queria já não é tão trabalhoso quanto antes. Por outro lado, as possibilidades que o computador oferece são infinitas. Elaborar uma ilustração acaba meio que se fundindo com explorar as opções que programas como o Painter ou o Photoshop oferecem. Do ponto de vista da produção, as ferramentas digitais tornaram menos tortuosas aquelas mudancinhas de última hora, aqueles retoques que sempre alguém acaba pedindo antes da arte ir pra gráfica. Também facilitam a produção em si; você consegue simular uma pintura a óleo sem ter que esperar secar as camadas e passar fixador.  Mas no que diz respeito à criação, à expressão gráfica da ilustração, isso não mudou muito, não. Aliás, não mudou nada. O traço, a solução do desenho, a capacidade de comunicar por meio da imagem, isto é do artista, não da máquina.

 

Mundo Leitura – Há mais espaço para o ilustrador de livros didáticos ou ficcionais?

Fábio – Sendo bons profissionais, há espaço para ambos. Há épocas em que existem mais trabalhos na área de didáticos do que na área de não didáticos e vice versa. No caso dos livros didáticos, essa demanda fracionada – em que há períodos sem trabalho algum enquanto que em outros dez editoras te ligam ao mesmo tempo –, tem a ver com o calendário de produção, que é baseado nas datas de editais de compra do governo.

 

Escrito por Jonas Ribeiro e ilustrado por fábio, o livro foi lançado em 2006

Mundo Leitura – O que é necessário para se filiar à Sociedade dos Ilustradores do Brasil? E qual a importância dessa Associação?

Fábio – A SIB é mais duradoura entidade de ilustradores que já houve no Brasil. Uma das coisas mais bacanas que a SIB oferece é o intercâmbio entre profissionais da ilustração das mais variadas áreas, por meio da lista SIB, que é a lista de discussões exclusiva para quem é associado. Essa troca de experiências, de ideias e opiniões é muito importante para o aprimoramento intelectual e profissional, além de servir como parâmetro para várias questões como valores, cláusulas contratuais, etc. Para se associar, basta ser um profissional da ilustração, com trabalhos próprios publicados, regularmente. É só acessar o site da SIB, www.sib.org.br, clicar em “Como se associar” e acessar a ficha de inscrição.

 

Mundo Leitura – Além do IlustraBrasil!, que outras ações a SIB realiza pela divulgação dos ilustradores brasileiros?

Fábio – Sem dúvida o IlustraBrasil! já se tornou o principal evento sobre ilustração no país. O evento inclui, além da tradicional exposição de trabalhos dos associados da SIB, uma série de palestras, oficinas e workshops voltados para profissionais da ilustração, estudantes e demais interessados. Além de São Paulo e Rio de Janeiro, o evento já está com previsão de acontecer em outras cidades a partir das próximas edições. A deste ano de 2011, a edição de número oito, teve um sabor todo especial, pois foi a primeira a acontecer em âmbito internacional, na China. Com o apoio do Ministério das Relações Exteriores, Consulado-Geral do Brasil em Xangai, a SIB, além de fazer uma exposição de trabalhos dos associados na The Foundry Gallery em Xangai, enviou três representantes e realizou uma série de palestras por lá, mostrando o trabalho dos associados para vários empresários e estudantes e divulgando a ilustração brasileira naquele país. Além do IB!, que é o carro-chefe das ações da SIB, há também uma exposição permanente de trabalhos dos associados dentro do site da SIB.

 

 

Contatos do ilustrador Fábio Sgroi

http://www.fabiosgroi.blogspot.com

fsgroi@terra.com.br

Tel: 11 4652-6728